segunda-feira, 21 de março de 2016

A COROLA DO TEMPO




Relógio das Flores de Garanhuns
Foto: Cícero Gomes

Ronildo Maia Leite


Fala-se agora do topo do Sinai,
um monte carrossel
de onde o olhar rodopia pelos vales
sempre muito verdes.
Embaixo dele,
O Relógio de Flores,
de fusos vegetais.

Os ponteiros são galhos de avencas,
o miolo esbugalha um girassol.
Uma rosa vermelha no meio-dia,
violetas uma hora da tarde,
papoulas às três,
hortências às quatro,
bogaris às cinco.
Rebentam lírios às seis da noite,
na hora da Ave-maria.

Cheio de graças esse alegre canteiro.
Caprichento esse relógio único.
Sete da noite
é a hora  mais inconsútil de um dia inteiro.
Hora indecisa.
Parca.
Lusco-fusca.
Nem é noite propriamente dita,
embora o dia já tenha ido embora.
É hora da indecisão dos boêmios,
de quem sai do trabalho.
Indecisos anjos,
precavidos fantasmas,
cochilantes ladrões
cingindo os lábios da boca-da-noite,
assim apelidada pelos repórteres policiais.
Nada nesse mundo se conclui,
ou começa nessa hora sem marcas.
Por isso,
uma margarida amarela,
a flor das almas, de pescoço fino, 
olho espremido,
onde imprecisos dedos
debulham encabuladas pétalas
jamais de mal-me-quer, bom que se diga.
Bem-me-quer, bem-me-quer, bem-me-quer.
É de tique-taque único esse relógio de flores.

Oito da noite, gradíolas.
Nove, azaléas.
Dez, orquídeas.
Onze crizantemos.
À meia-noite,
o relógio espreme as pernas numa virilha de gramas,
cravinas, laços-de-amor
e gerânios.
Sem falar nas folhas de eucaliptos
escapulindo do Parque Euclides Dourado
para barrufar o cangote da lua,
nuínha da silva,
que vem lá das bandas do Magano.

Remelexem-se os ponteiros.
Mudam o nome das horas
na proporção que a madrugada avança:
botão de cravo que vai se abrindo até às três,
quatro, 
cinco.
Às seis,
a grande rosa amarela
alumiando a manhã refrescante.

Mudando famílias:
begônias,
sorrisos-de-maria,
carinho-de-mãe,
cajados de São José.
Até ser de novo a rosa vermelha
no morno sol do meio-dia.

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