Prezado Secretario Fernando Duarte,
Acredito que as pessoas que trabalham com a cultura no estado de Pernambuco, técnicos, artistas e fornecedores diversos, desejam que seja frutífera a sua passagem pela nova secretaria e que de preferência a secretaria não seja passageira ou lotação para inúmeros cargos. Não o conheço pessoalmente, mas algumas pessoas que o conhecem informaram-me que o novo secretario é uma pessoa preparada para a função e pronta para ouvir a sociedade. Quanto ao preparo, só o tempo dirá. Considerando então a suposta abertura para o diálogo com a sociedade ( coisa que ademais todas as autoridades públicas deveriam ter, pois prestam um serviço a coletividade, embora algumas esqueçam disto rapidamente), tomei a liberdade de escrever este `email aberto', para desejar-lhe boas vindas e abordar alguns temas referentes a cultura que julgo importantes para a nossa reflexão. Não pretendo aqui fazer um apanhado das coisas que aconteceram na antiga gestão da Fundarpe, pois penso que o Senhor é bem ciente delas, penso que algumas foram acertadas e outras não e espero que aquelas acertadas permaneçam e as demais, sejam corrigidas. O meu desejo é tocar nestas outras. Então vamos lá: O Estado tornou-se um agente importantíssimo de fomento a cultura em Pernambuco e a Fundarpe o órgão principal de gerenciamento desta política. Muitos eventos foram realizados e um processo benéfico de descentralização foi iniciado levando recursos públicos para o interior também. Embora eu particularmente discorde de algumas formas ( a participação ativa demais de prefeituras que sequer tem um órgão responsável pela cultura em suas cidades), concordo com o processo maior de permitir o acesso cultural a grande número de pessoas. Até aí tudo quase bom, então chega a hora dos pagamentos… Aqui em Pernambuco virou a hora do pesadelo. Artistas técnicos, fornecedores e de forma geral qualquer um que trabalhe com a Fundarpe tem sempre uma reclamação quanto ao atraso muito grande nos pagamentos dos serviços prestados. O atraso é uma conversa recorrente nos bares da vida e nas noites recifenses. Não é preciso ser um gênio para entender que temos um grande problema nesta área e que sendo estes eventos quase sempre os mesmos todos os anos, um planejamento melhor poderia resolver a situação, ou então a instituição realizar apenas aquilo que pode. Este problema dos pagamentos não é uma questão só dos artistas, dentro da própria instituição muitas pessoas também não recebem em dia e é questionável se todo este atraso não viola seus direitos trabalhistas. Ha bolsistas, contratados, comissionados e todos eles precisam de um pouco de atenção. Não é possível manter e/ou desenvolver uma cadeia produtiva da cultura pagando sempre com atraso, tanto para quem presta o serviço, como para quem é responsável por gerenciar o mesmo. Aproveito esta deixa de funcionários diversos para perguntar... Quando teremos concurso publico para a Fundarpe e plano de cargos e salários para seus funcionários, valorizando-os? Sim, sei que alguns cargos continuarão sendo de confiança e não tenho problemas com isto, desde que não sejam 10 mil e as pessoas estejam ali por competência e não por pertencerem a este ou aquele partido. O Estado, quero recordar, nos pertence, a nós cidadãos, não aos partidos, mas infelizmente assistimos dia e noite no Brasil um loteamento de cargos que muitas vezes nada tem com mérito. Mérito secretario, também deveria ser o único critério para se eliminar ou aprovar um projeto artístico no Funcultura, não concorda? Não há razão para a manutenção deste modelo que elimina projetos por que falta uma carta de anuência, uma conta de luz ou algo do gênero. O único ‘envelope’ que deveria ser aberto deveria ser o do projeto artístico. Aprovou, tem-se um período para apresentar os documentos e assim firmar o contrato. Todas estas cartas de anuência, croquis, desenhos de luz, plantas baixas são obra de ficção, nos sabemos disto. Este amor casto pela burocracia também pode ser questionado. Há formas de se enviar estes projetos sem usar um só papel, o que além de diminuir a burocracia, ajuda a natureza. Grandes empresas que patrocinam a cultura tem adotado modelos totalmente informatizados onde os projetos são enviados on-line. É tão difícil fazer isto aqui?. Então quando falo no ‘envelope’ único, com o projeto artístico, me refiro a este sistema informatizado. Depois nós podemos mandar os documentos também digitais é claro. Não falta tecnologia no mundo de hoje para fazer tal coisa. Fazer coisas secretario, depende de muitos braços e algumas são mais fáceis que outras. Nós artistas podemos criar nossas obras,mas é bem complicado construir um teatro ou uma galeria um museu e etc. Aqui tratamos também da infraestrutura para a ampliação da nossa economia. Pernambuco assiste a uma significativa expansão da economia do estado, com investimentos em portos, rodovias, ferrovia, que atraem outros investimentos e alavancam a produção, melhorando a logística e etc . Embora não seja eu, um economista, posso garantir que sem investimento na infra estrutura cultural a produção cedo ou tarde vai minguar. Um economista que estiver aí a seu lado poderá facilmente explicar a razão. Sim, é mais fácil fazer uma peça teatral que construir um teatro. E não seria disto que estamos precisando? Temos um teatro de boa qualidade um cinema elogiado, um a literatura das melhores, artes plásticas e fotografia tb. E espaços culturais pra apresentar toda esta produção? Nossos teatros, por exemplo, passam a maior parte do tempo fechados e se concentram todos no centro da cidade. Por que não uma rede de espaços culturais permanentes nos bairros e nas cidades do interior, com sala de espetáculos, cinema, bibliotecas, galeria e espaços para ensaios. Uma rede assim facilitará a circulação do produto. Há modelos diversos para construção desta rede, alguns equipamentos permanentes, outros de estrutura modular semi-permanente e semelhantes a lonas circenses. Terei prazer em conversar sobre isto se desejar. Claro, que todas estas coisas precisam de recursos e de um comprometimento da nossa sociedade com a cultura. Penso que embora seja importante a participação do Estado na manutenção da cultura, chegou a hora destes empresários bronzeados mostrarem seu valor. Quantas salas de cinema a Fiat vai construir em Pernambuco? E o estaleiro atlântico sul, quantas bibliotecas? Quando ficarão prontos os teatros do Cabo de Santo Agostinho, Ipojuca, Jaboatão, estas cidades que não param de receber empresas. A grana investida no porto não é de todos? Queremos um comprometimento maior do empresariado pernambucano (sempre ausente) com a cultura e não estou falando em chás e colunas sociais. Penso que a secretaria pode fazer um chamamento da classe empresarial para uma maior participação financeira nos investimentos culturais. Não basta ficar usando imagens de caboclo de lança e passistas de frevo para divulgar suas marcas, não basta ser pai é preciso participar. Eu quero um pedaço de Suape para a cultura, eu quero um pedaço do pré-sal para a cultura e se nós encontrarmos ou desenvolvermos qualquer outra riqueza vou querer também. O desenvolvimento econômico do Estado não pode ficar na mão de meia dúzia. Um lugar que não aprecia e valoriza sua cultura e os agentes culturais é um ajuntamento e não uma civilização. Sei que isto não é algo diretamente ligado a secretaria de cultura, mas é política e podemos aproveitar o boom econômico também na estruturação das nossas cadeias produtivas. Pense com carinho e deus nos livre de artistas ingênuos.
Este email como escrito acima é aberto e estou publicando o mesmo no blog da Trupe. Espero ter iniciado uma conversa boa e desejo continuá-la, quem desejar participe também. Sinceramente desejo-lhe sucesso. Os contatos seguem abaixo. Elias Mouret. trupedecopas.blogspot.com eliasmouret@yahoo.com.br
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